Nota de Imprensa

Um Enxame e um Mar de Galáxias

5 de Maio de 2010

Uma nova imagem de grande campo divulgada hoje pelo ESO mostra vários milhares de galáxias longínquas, entre as quais se encontra um grande grupo pertencente a um enxame de galáxias de grande massa conhecido como Abell 315. Embora pareça já bastante denso em termos de objectos, este conjunto de galáxias é apenas a “ponta do icebergue”, uma vez que Abell 315 - tal como a maioria dos enxames de galáxias - é dominado por matéria escura. A enorme quantidade de massa deste enxame desvia a radiação emitida pelas galáxias de fundo, distorcendo ligeiramente as suas formas observadas.

Quando observamos o céu a olho nu, vemos principalmente estrelas da nossa Via Láctea e algumas pertencentes às galáxias vizinhas mais próximas. As galáxias mais distantes são muito pouco luminosas para puderem ser observadas a olho nu, mas se as pudéssemos ver, elas cobririam literalmente todo o céu. Esta nova imagem divulgada pelo ESO cobre uma grande região no céu e é simultaneamente muito profunda, ou seja, foi obtida durante um tempo de exposição elevado, revelando assim milhares de galáxias que se amontoam numa área do céu correspondente mais ou menos ao tamanho da Lua Cheia.

Estas galáxias encontram-se a diferentes distâncias da Terra. Algumas estão relativamente perto de nós, e nelas podemos distinguir os seus braços espirais ou os halos elípticos, principalmente na parte superior da imagem. As mais distantes aparecem apenas como pequenas manchas muito pouco luminosas - a sua luz viajou através do Universo durante oito mil milhões de anos ou mais antes de chegar à Terra.

Começando no centro da imagem e estendendo-se para baixo e para a esquerda, uma concentração de cerca de cem galáxias amareladas identifica um enxame de galáxias de grande massa, designado com o número 315 no catálogo compilado pelo astrónomo americano George Abell em 1958 [1]. O enxame situa-se entre as galáxias vermelhas e azuis de fraca luminosidade e a Terra, a cerca de dois mil milhões de anos-luz de distância, na Constelação da Baleia.

Os enxames de galáxias são uma das maiores estruturas do Universo ligadas gravitacionalmente. Mas estas estruturas são muito mais do que as galáxias que podemos ver. Na realidade, as galáxias contribuem com apenas 10% da massa, enquanto que o gás quente existente entre as galáxias contribui com mais 10% [2]. Os restantes 80% da massa são compostos por um ingrediente invisível e desconhecido chamado matéria escura que se encontra entre as galáxias.

A presença de matéria escura é revelada através do seu efeito gravitacional: a enorme massa do enxame de galáxias actua na radiação emitida por galáxias que se encontram por trás do enxame tal como uma lupa cósmica, encurvando a trajectória da luz e tornando as galáxias ligeiramente distorcidas [3]. Ao observar e analisar as formas distorcidas destas galáxias de fundo, os astrónomos podem estimar a massa total do enxame responsável por essa distorção, mesmo quando a maior parte da massa é invisível. No entanto, este efeito é normalmente muito pequeno e por isso é necessário medi-lo para um elevado número de galáxias de modo a obter resultados significativos: no caso de Abell 315, foram estudadas as formas de quase 10 000 galáxias de fraca luminosidade desta imagem, de modo a estimar a massa total do enxame, que resulta em cerca de cem biliões de vezes a massa do nosso Sol [4].

Para complementar a enorme escala de distâncias cósmicas e tamanhos mapeados nesta imagem, estão igualmente espalhados pelo campo um punhado de objectos muito mais pequenos do que galáxias e enxames de galáxias e muito mais próximos da Terra: para além de várias estrelas pertencentes à nossa Galáxia, muitos asteróides aparecem igualmente sob a forma de rastos azuis, verdes ou vermelhos [5]. Estes objectos pertencem à cintura de asteróides principal, situada entre as órbitas de Marte e Júpiter, e as suas dimensões variam desde algumas dezenas de quilómetros, para os mais brilhantes a apenas alguns quilómetros no caso dos menos brilhantes.

Esta imagem foi obtida com o instrumento Wide Field Imager montado no telescópio MPG/ESO de 2.2 metros, no Observatório de La Silla, Chile. É uma imagem composta por várias exposições adquiridas em três filtros de banda larga diferentes, num total de quase uma hora para o filtro B e meias horas para os filtros V e R. O tamanho do campo é de 34 x 33 minutos de arco.

Notas

[1] O catálogo de Abell de 1958 contém 2712 enxames de galáxias, tendo sido acrescentados mais 1361 enxames em 1989. Abell juntou esta impressionante colecção de objectos verificando visualmente placas fotográficas do céu, no intuito de procurar as regiões onde mais galáxias do que a média se encontravam aproximadamente à mesma distância de nós.

[2] Dez por cento da massa dum enxame de galáxias consiste numa mistura muito quente de protões e electrões (um plasma) com temperaturas tão altas como dez milhões de graus ou mais, o que o torna visível para os telescópios que operam em raios X.

[3] Os astrónomos referem-se a estas ligeiras distorções como lentes gravitacionais fracas, em oposição às lentes gravitacionais fortes, caracterizadas por fenómenos mais espectaculares tais como arcos gigantes, anéis e imagens múltiplas.

[4] Um estudo de lentes gravitacionais fracas do enxame de galáxias Abell 315 foi publicado num artigo científico que saiu em 2009 na revista da especialidade Astronomy & Astrophysics (“Weak lensing observations of potentially X-ray underluminous galaxy clusters”, por J. Dietrich et al.).

[5] Os rastos azuis, verdes ou vermelhos indicam que cada asteróide foi detectado por um dos três filtros, respectivamente. Cada rasto é composto por vários sub-rastos mais pequenos, reflectindo a sequência das diversas exposições realizadas em cada um dos filtros; a partir do tamanho destes sub-rastos podemos calcular a distância ao asteróide.

Informações adicionais

O ESO, o Observatório Europeu do Sul, é a mais importante organização europeia intergovernamental para a investigação em astronomia e é o observatório astronómico mais produtivo do mundo. O ESO é financiado por 14 países: Áustria, Alemanha, Bélgica, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Itália, Holanda, Portugal, Reino Unido, República Checa, Suécia e Suíça. O ESO destaca-se por levar a cabo um programa de trabalhos ambicioso, focado na concepção, construção e funcionamento de observatórios astronómicos terrestres de ponta, que possibilitam aos astrónomos importantes descobertas científicas. O ESO também tem um papel importante na promoção e organização de cooperação na investigação astronómica. O ESO mantém em funcionamento três observatórios de ponta, no Chile: La Silla, Paranal e Chajnantor. No Paranal, o ESO opera o Very Large Telescope, o observatório astronómico, no visível, mais avançado do mundo e o VISTA, o maior telescópio de rastreio do mundo. O ESO é o parceiro europeu do revolucionário telescópio ALMA, o maior projecto astronómico que existe actualmente. O ESO encontra-se a planear o European Extremely Large Telescope, E-ELT, um telescópio de 42 metros que observará na banda do visível e próximo infravermelho. O E-ELT será “o maior olho no céu do mundo”.

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Este texto é a tradução da Nota de Imprensa do ESO eso1019, cortesia do ESON, uma rede de pessoas nos Países Membros do ESO, que servem como pontos de contacto local com os meios de comunicação social, em ligação com os desenvolvimentos do ESO. A representante do nodo português é Margarida Serote.

Sobre a Nota de Imprensa

Nº da Notícia:eso1019pt
Nome:Abell 315
Tipo:Early Universe : Galaxy : Grouping : Cluster
Facility:MPG/ESO 2.2-metre telescope
Instrumentos:WFI

Imagens

The cluster of galaxies Abell 315
The cluster of galaxies Abell 315
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Around Abell 315
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Zooming in on Abell 315
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