Nota de Imprensa

Observações VLT de explosão de raios gama revelam ingredientes surpreendentes em galáxias primordiais

2 de Novembro de 2011

Uma equipa internacional de astrónomos utilizou a breve mas brilhante luz de uma explosão de raios gama distante para investigar a composição de galáxias muito distantes. Surpreendentemente as novas observações obtidas com o Very Large Telescope do ESO revelaram duas galáxias no Universo primordial mais ricas em elementos pesados que o Sol. As duas galáxias podem encontrar-se em processo de fusão. Tais processos no Universo primitivo originam a formação de muitas estrelas novas, podendo dar origem a explosões de raios gama.

As explosões de raios gama são as explosões mais brilhantes do Universo [1]. São inicialmente observadas por observatórios que se encontram em órbita terrestre, que detectam a curta explosão inicial de raios gama. Depois de localizadas as suas posições, são imediatamente estudadas utilizando telescópios de grandes dimensões instalados no solo, que detectam  a radiação visível e infravermelha remanescente emitida ainda nas horas e dias que se seguem à explosão inicial. Uma destas explosões, chamada GRB 090323 [2], foi inicialmente detectada pelo Telescópio Espacial Fermi Gamma-ray da NASA. Pouco tempo depois, o sinal emitido foi observado pelo detector de raios X do satélite Swift da NASA e pelo sistema GROND do telescópio MPG/ESO de 2.2 metros instalado no Chile (eso1049). Esta explosão foi estudada detalhadamente pelo Very Large Telescope (VLT) do ESO, apenas um dia depois da explosão inicial.

As observações obtidas com o VLT mostram que a luz brilhante emitida pela explosão de raios gama passou através  a própria galáxia hospedeira e também doutra galáxia próxima. Estas galáxias estão a ser observadas tal como eram há 12 mil milhões de anos atrás [3]. Galáxias tão distantes estão raramente envolvidas neste tipo de fenómenos.

“Quando estudámos a radiação emitida por esta explosão de raios gama não sabíamos o que iríamos encontrar. Foi surpreendente descobrir que o gás frio existente nestas duas galáxias do Universo primitivo tem uma composição química tão inesperada,” explica Sandra Savaglio (Instituto Max-Planck para a Física Extraterrestre, Garching, Alemanha), autora principal do artigo científico que descreve este estudo. “Estas galáxias têm mais elementos pesados do que o observado em qualquer galáxia do Universo primordial. Não esperávamos que o Universo estivesse tão cedo já tão evoluído em termos químicos.”

Quando a radiação da explosão de raios gama passou através das galáxias, o gás aí contido atuou como um filtro e absorveu parte desta radiação em certos comprimentos de onda. Sem a explosão de raios gama estas galáxias ténues seriam completamente invisíveis. Ao analisar cuidadosamente as impressões digitais dos diferentes elementos químicos, a equipa conseguiu determinar a composição do gás frio destas galáxias muito distantes e em particular descobriu o seu rico conteúdo em elementos pesados.

Espera-se que as galáxias no Universo primitivo tenham menor quantidade de elementos pesados do que as galáxias no Universo atual, tais como a Via Láctea. Os elementos pesados são produzidos ao longo da vida e morte de várias gerações de estrelas, que gradualmente vão enriquecendo o gás das galáxias [4]. Os astrónomos utilizam o enriquecimento químico das galáxias para determinar em que período das suas vidas estas se encontram. No entanto e surpreendentemente, estas novas observações revelaram que algumas galáxias são já muito ricas em elementos pesados numa altura correspondente a menos de dois mil milhões de anos depois do Big Bang, algo inimaginável até agora.

O par de galáxias jovens descoberto deve estar a formar estrelas a uma taxa extremamente elevada, de modo a poder enriquecer tanto e tão depressa o gás frio. Uma vez que as duas galáxias estão tão próximo uma da outra, é possível que se encontrem em processo de fusão, o que dará origem a formação estelar quando as nuvens de gás colidem entre si. Os novos resultados apoiam também a ideia de que as explosões de raios gama podem estar associadas a formação estelar intensa.

Formação estelar tão violenta como esta poderá ter cessado muito cedo na história do Universo. Doze mil milhões de anos mais tarde, ou seja, agora, os restos de tais galáxias conteriam um grande número de restos estelares tais como buracos negros e anãs brancas frias, formando uma população de “galáxias mortas” difíceis de detectar, apenas sombras ténues de como teriam sido nas suas juventudes brilhantes. Encontrar tais cadáveres atualmente seria um grande desafio.

“Tivemos muita sorte em observar a GRB 090323 quando ainda estava suficientemente brilhante, de tal modo que foi possível obter observações muito detalhadas com o VLT. As explosões de raios gama permanecem brilhantes apenas por curtos espaços de tempo, por isso conseguir dados de boa qualidade é muito difícil. Esperamos poder observar novamente estas galáxias num futuro não muito longínquo quando tivermos disponíveis instrumentos mais sensíveis. Estes objetos seriam um alvo ideal para o E-ELT,” conclui Savaglio.

Notas

[1] As explosões de raios gama que duram mais de dois segundos são chamadas de longa duração e as que duram menos são as de curta duração. As explosões de longa duração, incluindo a deste estudo, estão associadas a explosões de supernova de estrelas jovens de grande massa presentes em galáxias com formação estelar. As explosões de curta duração não são ainda bem compreendidas, mas pensa-se que têm origem na fusão de dois objetos compactos tais como estrelas de neutrões.

[2] O nome refere a data em que o objeto foi descoberto, neste caso 23 de Março de 2009.

[3] As galáxias foram observadas a um desvio para o vermelho de 3.57, o que corresponde a 1.8 mil milhões de anos depois do Big Bang.

[4] A matéria produzida pelo Big Bang, há 13.7 mil milhões de anos, era quase toda hidrogénio e hélio. Os elementos mais pesados, tais como oxigénio, azoto e carbono, foram posteriormente produzidos por reações termonucleares no interior das estrelas e lançados de volta às reservas de gás existentes na galáxia na altura da morte das estrelas. Por isso, espera-se que a quantidade de elementos pesados na maioria das galáxias aumente gradualmente à medida que o Universo envelhece.

Informações adicionais

Este trabalho foi apresentado num artigo científico “Super-solar Metal Abundances in Two Galaxies at z ~ 3.57 revealed by the GRB 090323 Afterglow Spectrum”  que será publicado na revista da especialidade Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

A equipa é composta por S. Savaglio (Max Planck Institute for Extraterrestrial Physics, Garching bei München, Alemanha [MPE]), A. Rau (MPE), J. Greiner (MPE), T. Krühler (MPE; Technische Universität München, Garching, Alemanha [TUM]), S. McBreen (University College Dublin, Irlanda; MPE), D. H. Hartmann (Clemson University, Clemson, EUA), A. C. Updike (Clemson), R. Filgas (MPE), S. Klose (Thüringer Landessternwarte Tautenburg, Alemanha), P. Afonso (MPE), C. Clemens (MPE), A. Küpcü Yoldas (ESO, Garching, Germany), F. Olivares E. (MPE), V. Sudilovsky (MPE; TUM) e G. Szokoly (Universidade de Eötvös, Budapeste, Hungria).

O ESO, o Observatório Europeu do Sul, é a mais importante organização europeia intergovernamental para a investigação em astronomia e é o observatório astronómico mais produtivo do mundo. O ESO é  financiado por 15 países: Alemanha, Áustria, Bélgica, Brasil, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Holanda, Itália, Portugal, Reino Unido, República Checa, Suécia e Suíça. O ESO destaca-se por levar a cabo um programa de trabalhos ambicioso, focado na concepção, construção e funcionamento de observatórios astronómicos terrestres de ponta, que possibilitam aos astrónomos importantes descobertas científicas. O ESO também tem um papel importante na promoção e organização de cooperação na investigação astronómica. O ESO mantém em funcionamento três observatórios de ponta, no Chile: La Silla, Paranal e Chajnantor. No Paranal, o ESO opera  o Very Large Telescope, o observatório astronómico óptico mais avançado do mundo e dois telescópios de rastreio. O VISTA, o maior telescópio de rastreio do mundo que trabalha no infravermelho e o VLT Survey Telescope, o maior telescópio concebido exclusivamente para mapear os céus no visível. O ESO é o parceiro europeu do revolucionário telescópio  ALMA, o maior projeto astronómico que existe atualmente. O ESO encontra-se a planear o European Extremely Large Telescope, E-ELT, um telescópio da classe dos 40 metros que observará na banda do visível e próximo infravermelho. O E-ELT será “o maior olho no céu do mundo”.

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Este texto é a tradução da Nota de Imprensa do ESO eso1143, cortesia do ESON, uma rede de pessoas nos Países Membros do ESO, que servem como pontos de contacto local com os meios de comunicação social, em ligação com os desenvolvimentos do ESO. A representante do nodo português é Margarida Serote.

Sobre a Nota de Imprensa

Nº da Notícia:eso1143pt
Nome:Gamma-ray burst
Tipo:Early Universe : Cosmology : Phenomenon : Gamma Ray Burst
Facility:Very Large Telescope
Instrumentos:FORS2
Science data:2012MNRAS.420..627S

Imagens

Artist’s impression of a gamma-ray burst shining through two young galaxies in the early Universe
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apenas em inglês
Artist’s impression of a gamma-ray burst shining through two young galaxies in the early Universe
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