Nota de Imprensa

Explosão rádio enigmática ilumina o halo tranquilo de uma galáxia

26 de Setembro de 2019

Com o auxílio do Very Large Telescope do ESO, os astrónomos observaram pela primeira vez uma explosão de ondas rádio rápida a passar por um halo galáctico. Com uma duração de menos de um milissegundo, esta explosão enigmática de ondas rádio cósmicas chegou quase imperturbável até à Terra, sugerindo assim que o halo da galáxia atravessado tem uma densidade surpreendentemente baixa e um campo magnético bastante fraco. Esta nova técnica poderá ser usada para explorar halos esquivos de outras galáxias.

Utilizando um mistério cósmico para investigar outro, os astrónomos analisaram o sinal de uma explosão de ondas rádio rápida no intuito de estudarem o gás difuso existente no halo de uma galáxia massiva [1]. Em Novembro de 2018, o rádio telescópio ASKAP (Australian Square Kilometre Array Pathfinder) observou uma explosão de ondas rádio rápida, chamada FBR 181112. Observações de seguimento levadas a cabo com o Very Large Telescope (VLT) e outros telescópios revelaram que as pulsações rádio passaram pelo halo de uma galáxia massiva na sua trajectória até à Terra. Esta descoberta permitiu aos astrónomos analisar os sinais rádio no intuito de extrair informações sobre a natureza do halo de gás.

O sinal da explosão rádio rápida expôs a natureza do campo magnético existente em torno da galáxia e a estrutura do halo de gás. O estudo demonstra uma nova técnica para explorar a natureza de halos de galáxia,” disse J. Xavier Prochaska, professor de Astronomia e Astrofísica na Universidade de Santa Cruz, Califórnia, EUA, e autor principal de um artigo científico que apresenta estes novos resultados e que foi publicado hoje na revista Science.

Os astrónomos ainda não sabem o que causa as explosões de ondas rádio rápidas e apenas recentemente conseguiram localizar as galáxias que deram origem a alguns destes novos sinais rádio muito brilhantes e curtos. “Assim que sobrepusemos as imagens rádio e visíveis, vimos logo que esta explosão rádio passava pelo halo de uma galáxia localizada mais perto de nós e que, pela primeira vez, tínhamos uma maneira direta de investigar a matéria que rodeia esta galáxia, matéria esta que é invisível doutro modo,” disse a co-autora do artigo Cherie Day, estudante de doutoramento na Universidade de Tecnologia de Swinburne, na Austrália.

Um halo galáctico contém tanto matéria escura como normal ou bariónica, esta última encontrando-se essencialmente sob a forma de um gás quente ionizado. Enquanto a parte luminosa de uma galáxia massiva pode ter uma dimensão de cerca de 30 000 anos-luz, o seu halo mais ou menos esférico apresenta um diâmetro dez vezes maior. O gás do halo alimenta a formação estelar, à medida que se move em direção ao centro da galáxia, enquanto outros processos, tais como explosões de supernovas, podem lançar material para fora das regiões de formação estelar e em direção ao halo galáctico. Uma das razões pelas quais os astrónomos estudam o gás do halo prende-se com o facto de tentarem compreender melhor estes processos de ejeção, os quais podem “desligar” a formação estelar.

O halo desta galáxia é surpreendentemente calmo,” diz Prochaska. “O sinal rádio passou pela galáxia quase sem ser perturbado, o que contradiz modelos anteriores que previam o que deveria acontecer a explosões rádio nestas circunstâncias.

O sinal de FRB 181112 era composto por diversas pulsações, cada uma com menos de 40 microssegundos de duração (10 000 vezes mais curtas que um piscar de olhos). Esta curta duração das pulsações dá-nos um limite superior para a densidade do gás do halo, uma vez que a passagem por um meio mais denso alargaria a duração do sinal rádio. Os investigadores calcularam que a densidade do gás do halo deverá ser inferior a 0,1 átomos por centímetro cúbito (equivalente a algumas centenas de átomos num volume correspondente a um balão de criança) [2].

Tal como o ar estremece num dia quente de verão, também a atmosfera ténue nesta galáxia massiva deveria deformar o sinal da explosão de ondas rádio rápida. Em vez disso, recebemos um sinal tão limpo e nítido que não existe praticamente nenhuma assinatura do gás por onde passou,” disse o co-autor Jean-Pierre Macquart, astrónomo no International Center for Radio Astronomy Research da Universidade de Curtin, na Austrália.

O estudo não encontrou evidências de nuvens turbulentas frias ou pequenos nodos densos de gás frio. O sinal de rádio também nos deu informação sobre o campo magnético do halo, o qual é muito fraco — um milhar de milhões de vezes mais fraco que o de um imã de frigorífico.

Nesta altura, com resultados para apenas um halo galáctico, os investigadores não podem dizer se a densidade baixa e campo magnético fraco que mediram são invulgares ou se estudos anteriores de halos galácticos sobrestimaram estas propriedades. Prochaska espera que o ASKAP e outros rádio telescópios usem mais explosões de ondas rádio rápidas para estudarem outros halos galácticos e investigar as suas propriedades.

Esta galáxia pode ser especial,” disse Prochaska. “Temos que utilizar explosões de ondas rádio rápidas para estudar dezenas ou centenas de galáxias com uma grande variedade de massas e idades para investigarmos a população completa.” Telescópios ópticos como o VLT do ESO desempenham um papel importante ao revelar quão longe se encontra a galáxia que deu origem a cada explosão de ondas rádio, assim como se a explosão passou através do halo de alguma galáxia situado mais perto de nós.

Notas

[1] Um enorme halo de gás de densidade baixa estende-se muito para além da parte luminosa de uma galáxia, local onde as estrelas se concentram. Apesar deste gás quente e difuso constituir uma maior parte da massa da galáxia do que as estrelas, o certo é que é muito difícil estudar.

[2] A densidade limita também a possibilidade de existência de turbulência ou nuvens de gás frio no halo. Frio aqui é um termo relativo, referindo-se a temperaturas de cerca de 10 000º C, comparativamente ao gás quente do halo com cerca de 1 milhão de graus Celsius.

Informações adicionais

Este trabalho foi descrito num artigo científico publicado a 26 de Setembro de 2019 na revista Science.

A equipa é composta por J. Xavier Prochaska (University of California Observatories-Lick Observatory, University of California, EUA e Kavli Institute for the Physics and Mathematics of the Universe, Japão), Jean-Pierre Macquart (International Centre for Radio Astronomy Research, Curtin University, Austrália), Matthew McQuinn (Astronomy Department, University of Washington, EUA), Sunil Simha (University of California Observatories-Lick Observatory, University of California, EUA), Ryan M. Shannon (Centre for Astrophysics and Supercomputing, Swinburne University of Technology, Austrália), Cherie K. Day (Centre for Astrophysics and Supercomputing, Swinburne University of Technology, Austrália e Commonwealth Science and Industrial Research Organisation, Australia Telescope National Facility, Austrália), Lachlan Marnoch (Industrial Research Organisation, Australia Telescope National Facility e Department of Physics and Astronomy, Macquarie University, Austrália), Stuart Ryder (Department of Physics and Astronomy, Macquarie University, Austrália), Adam Deller (Centre for Astrophysics and Supercomputing, Swinburne University of Technology, Austrália), Keith W. Bannister (Commonwealth Science and Industrial Research Organisation, Australia Telescope National Facility, Austrália), Shivani Bhandari (Commonwealth Science and Industrial Research Organisation, Australia Telescope National Facility, Austrália), Rongmon Bordoloi (North Carolina State University, Department of Physics, EUA),  John Bunton (Commonwealth Science and Industrial Research Organisation, Australia Telescope National Facility, Austrália), Hyerin Cho (School of Physics and Chemistry, Gwangju Institute of Science and Technology, Coreia do Sul), Chris Flynn (Centre for Astrophysics and Supercomputing, Swinburne University of Technology, Austrália), Elizabeth Mahony (Commonwealth Science and Industrial Research Organisation, Australia Telescope National Facility, Austrália), Chris Phillips (Commonwealth Science and Industrial Research Organisation, Australia Telescope National Facility, Austrália), Hao Qiu (Sydney Institute for Astronomy, School of Physics, University of Sydney, Austrália), Nicolas Tejos (Instituto de Fisica, Pontificia Universidad Catolica de Valparaiso, Chile).

O ESO é a mais importante organização europeia intergovernamental para a investigação em astronomia e é de longe o observatório astronómico mais produtivo do mundo. O ESO tem 16 Estados Membros: Alemanha, Áustria, Bélgica, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Holanda, Irlanda, Itália, Polónia, Portugal, Reino Unido, República Checa, Suécia e Suíça, para além do país de acolhimento, o Chile, e a Austrália, um parceiro estratégico. O ESO destaca-se por levar a cabo um programa de trabalhos ambicioso, focado na concepção, construção e operação de observatórios astronómicos terrestres de ponta, que possibilitam aos astrónomos importantes descobertas científicas. O ESO também tem um papel importante na promoção e organização de cooperação na investigação astronómica. O ESO mantém em funcionamento três observatórios de ponta no Chile: La Silla, Paranal e Chajnantor. No Paranal, o ESO opera  o Very Large Telescope e o Interferómetro do Very Large Telescope, o observatório astronómico óptico mais avançado do mundo, para além de dois telescópios de rastreio: o VISTA, que trabalha no infravermelho, e o VLT Survey Telescope, concebido exclusivamente para mapear os céus no visível. O ESO é também um parceiro principal em duas infraestruturas situadas no Chajnantor, o APEX e o ALMA, o maior projeto astronómico que existe atualmente. E no Cerro Armazones, próximo do Paranal, o ESO está a construir o Extremely Large Telescope (ELT) de 39 metros, que será “o maior olho do mundo virado para o céu”.

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Contactos

J. Xavier Prochaska
UCO/Lick Observatory — UC Santa Cruz
USA
Tel: +1 (831) 295-0111
Email: xavier@ucolick.org

Cherie Day
Centre for Astrophysics and Supercomputing — Swinburne University of Technology
Australia
Tel: +61 4 5946 3110
Email: cday@swin.edu.au

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Este texto é a tradução da Nota de Imprensa do ESO eso1915, cortesia do ESON, uma rede de pessoas nos Países Membros do ESO, que servem como pontos de contacto local com os meios de comunicação social, em ligação com os desenvolvimentos do ESO. A representante do nodo português é Margarida Serote.

Sobre a Nota de Imprensa

Nº da Notícia:eso1915pt
Nome:FRB 181112
Tipo:Early Universe : Galaxy : Activity : AGN
Facility:Very Large Telescope
Instrumentos:FORS2
Science data:2019Sci...366..231P

Imagens

Imagem artística de uma explosão rádio rápida a viajar pelo espaço em direção à Terra
Imagem artística de uma explosão rádio rápida a viajar pelo espaço em direção à Terra
Diagrama que mostra o percurso de FRB 181112 a passar pelo halo de uma galáxia
Diagrama que mostra o percurso de FRB 181112 a passar pelo halo de uma galáxia
Imagem VLT da localização de FRB 181112
Imagem VLT da localização de FRB 181112

Vídeos

ESOcast 207 Light: Explosão rádio enigmática ilumina o halo tranquilo de uma galáxia (4K UHD)
ESOcast 207 Light: Explosão rádio enigmática ilumina o halo tranquilo de uma galáxia (4K UHD)
Animação do sinal FRB 181112 a viajar pelo espaço
Animação do sinal FRB 181112 a viajar pelo espaço